quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

#Escorpião

E de repente me vem aquela saudade doída de você, escorpião. E começa a semana e começa o dia e o tempo vai cravando feito estaca no meu peito e eu vou sangrando e criando azedume. E você aguenta pacientemente cada segundo azedo só porque você é um bichinho muito paciente e porque sabe que não adianta nada se irritar porque o azedo não passa nem quando eu como um pote inteiro de açúcar mascavo enquanto você não chega. Eu penso uma vez e mais uma vez e mais outra vez em você e te procuro nos meus bolsos mesmo com todo mundo me dizendo que você é perigoso e que o que eu sinto é perigoso e que me alimentar de você é perigoso e que te esperar é perigoso e que viver de ti é perigoso e que viver pra ti é perigoso. E todo mundo me diz que tudo é perigoso e eu nem ligo e eu nem me importo e nem nunca me importei. Nunca tive medo de perigo, escorpião. Dizem que picada dói, mas eu não tenho medo porque sei o quanto dói ficar longe de você. E de picada eu só tenho medo de agulha. Mesmo assim eu tenho um peixe tatuado nas costas e tenho você tatuado no coração, escorpião. E tatuei sem anestesia, com orgulho de ser pra você e de ser você e de ser eu e de ser nós. E por você eu correria quilômetros e correria milhas e correria riscos. E por você eu nadaria e, se eu não fosse um peixe, até me afogaria naquelas águas noturnas de verão. De verão porque escorpião aparece no verão, bem por aqueles dias do calendário em que você desceu da torre e apareceu na minha frente pela primeira vez. E eu não tive escolha porque sabia que seria impossível não te desejar e que todo esse desejo queimaria mesmo se aquele verão fosse inverno, escorpião. E eu comecei a desejar tua casca, teu casco e as tuas patas, todas as tuas patas, deslizando na minha pele. E a tua pele na minha arrepia, vicia, escorpião. E eles dizem que você é venenoso e eu fico rindo sozinha porque eles não conhecem nadinha do que você tem aí por dentro. Você sabe ser tão pequeno e tão frágil e tão doce e tão grande e tão forte e tão meu. E eu fico rindo porque você é tão lindo e tão talentoso e tão teimoso e tão manhoso e tão desligado e tão atento e tão inteligente e tão admirável que chega a me doer. E eles dizem que você é venenoso e não conhecem nem o teu veneno de escorpião. Nos teus braços a morte é doce. Sei porque morri de amor. Teu veneno tem açúcar e a doçura mais letal que eu já provei, escorpião.

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